quarta-feira, setembro 27, 2006

Ex-voto - (14/04/05)


Tenho medo de objetos q pertenceram ao amor antigo.
Um medo estranho, dolorido e não me deixa dormir se eles estiverem perto de mim.
É algo bem difícil de explicar e, se eu fosse um pouquinho mais adolescente, talvez até possível de entender, mas é algo assim como se o objeto estivesse carregado da energia do amor q se foi, impregnado de cheiros, gostos e sensações e que estes elementos pudessem se consubstanciar do morto e, de repente, me tocar.
Como explicar um medo?
Cada medo tem seu conjunto único de elementos combinados e imensuráveis aspectos, além, de serem aplicáveis a apenas um individuo. Mas eu vou tentar descrever algumas nuances deste meu peculiar.
Evito os perfumes. Tenho medo dos cheiros. Medo deles se tornarem uma névoa venenosa e tentarem me sufocar. Imagino tonturas e vertigens que começam pelo nariz e atingem, em cheio, os olhos, às vezes, sem passar pelo cérebro. Vá tentar explicar isso a neuropsicologia, mas é desse jeito q ocorre.
Outro objeto assustador é, se houver, um ursinho de pelúcia ou similar. Este agourento brinquedo, q antes, tão delicadamente, lembrava o ser amado, agora cria asas sinistras e ganha vida, e voa, e ataca, e morde, e bate, maltrata e, o mais incrível de tudo, não deixa marcas. Desses, a parapsicologia deve se encarregar.
Peças de roupa do ex-amado também devem ser mantidas bem longe. De preferência (qnd não puderem ser devolvidas), devem ser lacradas em sacos plásticos resistentes e acondicionadas em caixas que serão levadas para porões, sótons ou maleiros de armários altos, onde não se possa facilmente acessar. Pois, se daí escapam, liberam um pó do antigo amor, junto com as células que carregam – substancia capaz de paralisar a vítima por horas ainda que ninguém, ao redor, perceba. Esse fato transcende a ciência e deve ser tema de estudo da Metafísica.
Correntes e anéis que lembrem devem seguir o mesmo procedimento das roupas. A diferença se dá na forma como estes agem sobre a vítima, tentando cortar-lhes os pulso, o pescoço, os dedos... estes últimos, sobreviventes depois q vão-se os anéis. A depender da forma como eram lembrados, estes objetos causam na vítima, um horror maior que os demais.
Cartas. Devem ser rasgadas e incineradas, cinzas de cartas de amor causam náuseas, por isso incinerar é mais seguro, pra evitar q sejam relidas no silêncio da noite, causando insônia e todos os distúrbios q a acompanham no dia seguinte. Esse procedimento evitará tranqüilizantes e futuras tarjas pretas.
E-mails devem ser deletados. É bom trocar a senha e, se possível, todo o endereço, o loguin, o provedor e, se não puder ser feito isso, devem ser bloqueados alguns endereços e até os itens enviados devem ser apagados. Há casos de pessoas que não fizeram isso e foram infectadas por vírus letais q nem a Biologia, nem a Informática e nem Freud explica.
Por último, o objeto mais perigoso e aterrorizante de todos: as fotografias. Estremeço diante destas. Tenho calafrios só de pensar.
Nada mais amedrontador q o olhar de fotos de ex-amor. Muda, sabe? Só quem já olhou pro seu ex num retrato sabe o frio q dá na espinha, o ardor na barriga, a falta q faz o ar aos pulmões ao ver, naqueles olhos, o olhar q já não está lá. Além disso, os sorrisos das fotos... Os rostos se transfiguram. Começam a fazer caretas, as mãos q abraçavam, tentam apertar, machucar e dilaceram a carne, trituram os ossos e penetram na medula, junto com os olhares, entorpecendo a vítima até que a mesma, sem forças, venha desmaiar.
Fotos são fatais.
É preciso muita coragem para guarda-las de costas no álbum e esconder este entre livros q serão mantidos em caixas lacradas. Muito mais coragem ainda é preciso, se o afligido optar por destruí-las. Nesse caso elas podem paralisar as mãos, os braços, e o corpo inteiro q as toca, provocando intensa dor e queimaduras internas. E é nesse momento também, q elas liberam uma substância mágica (elemento só agora citado) q fará sua imagem permanecer na retina da vítima e a mesma, a partir daí, poderá ser tomada por surtos de olhar o vazio, ao acaso. E esse é o estágio menos grave. Há registros de quem, tendo passado por tal situação, comece a dizer palavras incompreensíveis, ouvir vozes, rir ou chorar sem motivo aparente, andar por ruas vazia, distrair-se facilmente, e até, pasmem, voar...
Há os que começam intermináveis terapias e, vítimas mais graves podem até desenvolver desejos suicidas, indo, algumas parar no lugar onde, muitos dos q continuaram lendo até aqui, e eu, q escrevo, poderíamos estar... O sinistro lugar q aterroriza os loucos.
Lá, a imagem dos objetos será lavada do cérebro pela força de camisas e cabos ligados a alta tensão. E as dores... Bom, nesse lugar é provável q todas as dores, antes tidas como psicológicas, passem à esfera das coisas reais.
Claro q tudo pode se agravar muito se vc tiver um ex-amor no MSN, ICQ, Yahoo Messenger e, do tenebroso Orkut. O q fica pior se vcs trocavam scraps, tinham comunidades em comum, amigos, eram fãs, etc. E ainda pode se tornar crítico se já se tiverem escrito testimonials. Aí é f! São marcas públicas. Coisas mais difíceis de un join...
Porém, nem tudo está perdido. Há um único e eficaz remédio. O divino, o celestial, o sublime, o sobrenatural senhor Tempo.
Este distinto, reside nas folhas dos calendários e agendas cheias, folinhas e coisas do gênero.
Se o tempo fosse uma divindade na Bahia, a distância seria o seu Orixá e, nesse caso, eu estaria bem protegida.
Senhor de todos os males é o tempo.
E, pra não perder o patrocínio q eu ainda quero ganhar, para todas as outras coisas, existe Máster Card.
Depois, chega um amor novo. E o coração da gente q é como criança, começa tudo de novo.
E aí vêm os novos objetos, as novas promessas...
É o recomeçar.

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