sábado, agosto 25, 2007

Um, dos outros

Sem
(By Audrey F.)


Ela escreve porque não tem um grande amor. Se tivesse, não compraria canetas e blocos. É triste não ter um grande amor. As pessoas que não têm um grande amor freqüentam mais as livrarias. Vez ou outra, ameaçam olhar por cima da prateleira de livros, com a vaga sensação de que, do lado de lá, naquele exato instante, alguém arrisca o mesmo olhar.

As pessoas que não têm um grande amor também podem ser vistas em bancos de concreto e nas filas do cinema. Uma vez, um amigo me contou que viu uma pessoa sem grande amor comprando flores numa daquelas bancas da Doutor Arnaldo. Ela tinha um sorriso postiço, ele me disse. E contou que, intrigado, decidiu seguir a tal pessoa. Ela atravessou a faixa de pedestres ainda inteira com o maço de amarelos e vermelhos berrantes nos braços. No canteiro, deu sinais de que iria desmontar e, na esquina, a pessoa sem grande amor já segurava o maço com uma mão só e usava a outra para enxugar as lágrimas.

Eu também soube de um caso de uma pessoa sem grande amor que freqüentava padarias. "Bom dia, Sandro. Melhorou da gripe, Oswaldo? Um pingado bem clarinho, Tina." Era tão simpática que ninguém desconfiava. Só teve um dia em que deixou o pão com manteiga pela metade e saiu sem se despedir. O pessoal estranhou, mas ninguém percebeu mesmo que era uma dessas pessoas que não têm um grande amor. Uma coisa é fato: elas gastam mais tinta de caneta que as outras, as que têm um grande amor. Sim, porque estas podem dar-se ao luxo dos bilhetes. Três ou quatro frases e fica tudo dito. Já as pessoas que não têm um grande amor precisam se dedicar às teorias. E lá se vão páginas e páginas para arranjar argumento que explique porque é que tal pessoa não tem um grande amor. E tudo nas entrelinhas, claro, porque não se pode ser tão objetivo com essa coisa de não ter grande amor.

Sei de uma moça que descobriu de cedo o problema. Lá pelos 7, desatou a gastar o dinheiro do lanche da escola com tinta nanquim, caneta bico de pena, caderno mais bonito. Depois, ela cresceu. A última vez que soube, ela estava sentada no ponto de ônibus com ares de que, a qualquer momento, o seu poderia chegar. Os que têm um grande amor, é fato, não ficam tão tensos no ponto de ônibus. Parece que têm menos o que esperar. As pessoas que não têm um grande amor, imagine, esperam tudo num ponto de ônibus. Até o cobrador é potencialmente amável.

Uma tia me disse que, quando ela era criança, uma pessoa que não tinha um grande amor desapareceu, assim da noite para o dia, depois de um vendaval. A mãe dela dizia que a tal pessoa sem amor jurava que o portão estava batendo e que não era por causa do vento. Foi para a varanda e, zupt!, desapareceu. A mãe da moça disse que era o grande amor dela no portão, mas, na dúvida, o pessoal espalhou que era o vento mesmo. "É mais fácil o vento levantar uma pessoa do que o grande amor buscar a gente no portão", minha tia disse.

Eu acredito. A última pessoa que eu conheci que tinha um grande amor era no cinema. No mais, é só pessoa que não tem grande amor, feito ela. Ela que escreve e freqüenta mais as livrarias e, vez ou outra, ameaça olhar por cima da prateleira de livros, com a vaga sensação de que, do lado de lá, naquele instante, alguém pode arriscar o mesmo olhar.

***

Snow, q anda meio sem escrever nada.
E não sabe explicar o pq mas, desconfia q as pessoas q não têm um grande amor tb devam ter lá os seus momentos de parecer q não o têm mesmo.

5 comentários:

Anônimo disse...

Que bom que apareceu. Comecei a ficar preocupado com o seu sumisso virtual que poderia ser real também com tanta violência, sacomèquié. Quanto ao post, tenho sido a favor destas teorias simplistas que explicam um monte de coisa em uma só. E deve ter um fundo de verdade, embora eu não compre um caderno há uns 3 anos, em breve as letras do meu teclado vão sumir... e você, vê se aparece mais... bjo

Anônimo disse...

Por via das dúvidas, melhor deixar registrada minha presença neste post.

Felipe Rosa disse...

Su, acho que meu último escrito tem lá suas raízes belmontianas. Obrigado por ele, então =)
Beijo!

(não ta no escrevomitar, tá em http://momentsjustcombusting.blogspot.com )

Felipe Rosa disse...

Deletei alguns posts do escrevomitar. Dei uma limpa. Acho que está mais apresentável.

Infelizmente alguns comentários teus foram juntos... Não se magoe, se pudesse os guardava. Mas, eles, sozinhos, numa página de word, não são eles.

Beijos!

Felipe Rosa disse...

corrigindo:

http://momentscombusting.blogspot.com