domingo, setembro 28, 2008

São tantas coisas...

A vida é um montão de coisas pequenas amontoadas.
(Coisas grandes também são coisas pequenas.)
Eu ando observando uns moradores de rua com suas bagagens há algum tempo...
Eu que não gosto de carregar coisas quando saio, mas sei que a quantidade de coisas que levarei dependerá sempre do tamanho da bolsa que vou escolher, fiquei pensando nos que têm que levar consigo o seu próprio cobertor-colchão, sua própria latinha-panela e a roupa... junto com o frio, a fome e a sujeira. E o cachorro.
Faz alguns meses assisti à reportagem sobre um morador de rua que passou num concurso público. Ele estudava com livros de bibliotecas públicas, em praças também públicas.
À época fiz inúmeras imagens dessa notícia tão cheia de lacunas quase inimagináveis e, confesso que só não tive inveja porque ele agora é funcionário do Banco do Brasil e eu, definitivamente, odeio contar dinheiro.
Mas eu sei que ele agora é parte do grupo dos que podem ter coisas.
O que fez com que essa história ficasse gravada em minha memória emotiva foi quando na entrevista o repórter perguntou o que ele mais queria ter das coisas que ele agora podia e de pronto ele respondeu: "Quero formar uma família.".
E eu que assistia à reportagem toda preocupada com a reação dos colegas dele na agência e das pessoas freqüentadoras e em como seria para ele conviver com essa evidência de constrangimentos e ter que ir todo esse primeiro mês, mesmo sem o dinheiro do transporte, trabalhar e voltar...( pra onde?!) tocar de roupa (?!), já estava me sentindo o mais impotente dos seres por morar em outro estado e não poder fazer nada por aquele que eu sabia que tanto precisava, percebi, assustada como se fora novidade, o quão insignificantes e pequenas são as coisas depois que a gente passa numa prova.
Recentemente um casal dentre os que considero como melhores amigos que já tive e tenho, nesse caso há quase 18 anos, esteve separado por algumas semanas. E eu acompanhei o conturbado processo quase como um dos filhos, dividida e sem tomar partido.
Mas hoje fomos à praia, como nos velhos tempos...
Durante todo o caminho da ida minha cabeça quase doía de tão cheia das tantas imagens dos momentos bons e das brigas nesse tempo todo que têm em comum. E ver como isso se misturava às imagens do momento quando no fim do dia ela reclamou por ele ter colocado a fralda suja de areia na mesma sacola que a mamadeira e de como ele aceitava os carinhos como quem recebe massagens onde está doendo. Era visível que eles estavam se perdoando.
Outra cena marcante foi quando ela comentou, longe da presença dele, e relembramos o dia em que há 12 anos atrás ele chegou em casa com uma televisão preta e branca de presente para ela. Nessa ocasião a alegria foi tanta que passaram a noite inteira assistindo a TV. Usada, comprada com uma renda de um salário mínimo, sabe-se lá em quantas parcelas...
Outra parte interessante foram os vendedores ambulantes das praias com seus amendoins, castanhas, ovos de codorna e caldos, todos afrodisíacos. Este último tinha também a versão homem-aranha, que é quase explícito mais ele explicava: “É pra subir pelas paredes e ir parar no teto!”. Compramos todos. Ora pelo marketing, ora pelo gosto. Mas cá pra nós, eu adoro essas superstições regionais/locais e acho em tudo isso uma graça indescritível.
Alugar a bóia e ficar boiando com a mãe e os maiores também foi muito divertido. (Eles têm, além de mim, mais quatro crianças.).
Foi boa a praia como a praia da minha infância.
Há, porém um link entre essa história e a do ex-mendigo do início. A principal exigência nupcial do novo contrato foi, recíproca, que ela, ocupante de um cargo de confiança, equiparada a servidora pública e, portanto funcionária do estado, deixasse o emprego. E assim foi feito.
Saiu com a roupa do corpo, sem se despedir ou assinar o destrato. Sequer esvaziar as gavetas.
No final do dia de sol, eles, que passaram a maior parte passeio sob a sombra protegendo o menorzinho, voltaram com seus pertences, sacolas, mochilas e filhos pra casa.
E eu, que passei boa parte do tempo exposta (porque não acho isso todo dia!), guardei na bolsa o meu protetor solar, cartão de crédito, soro fisiológico, bolsinha para moedas, telefone celular, chapéu, creme para pentear, cartão de meia-passagem, estojo para lentes, espelho e pente, hidratante, bronzeador, óculos de sol e toalhinha.
Fiquei pensando em como faz calor nas noites pós praia...

E voltei pra casa só. Eu e minha marquinha.

Snow, pensando em comprar um cachorro.

Nenhum comentário: