quinta-feira, dezembro 25, 2008

Note e Net

Estou neste momento me perguntando se esta imperativa tecnologia recém chegada me deixará pelos próximos dias fazer alguma coisa que não seja fazer apenas tudo o que eu não fiz a vida inteira?
Não, a vida inteira é exagero. Mas uns 13 anos é a minha conta desde que desejei ver um pouco mais de perto tudo isto do que ainda hoje não entendo quase nada.
São seis da manhã e eu não pude fazer outra coisa desde ontem à noite... hipnotizada, enfeitiçada. Diria, terrivelmente amaldiçoada como um viciado. E já estou me perguntando se haverá mesmo uma cura – o que a esta altura, já tenho dúvidas.
Pode até haver, mas por hora vou baixar todos os pequenos arquivos que armazenei em e-mails e vou ler todos os que não foram ainda lidos e vou transformar tudo o que for de caractere em byte. E quando tudo o que hover pra fazer esgotar, porque tudo o que é infinito satura, então eu desde já tenho medo que, dependente, não saiba mais o que fazer a não ser ser... on line.
Desliguei agora à pouco porque já implorava o corpo, mas a ansiedade não quer deixar dormir, nem comer – claro, comigo o verbo comer é o primeiro que vai pro espaço – logo as outras funções vitais ficam todas debilitadas até que o corpo obriga a parar. Mas deitada, sinto que sou uma extensão dos pulsos elétricos. Como quando a gente chega de uma viagem de barco. Vejo que não é à toa a expressão “navegar” ter se adaptado tão bem a este universo. Confesso que estou meio tonta.
Olhei agora à pouco pra o Nietzsche em cima da cabeceira, meu velho companheiro nestas últimas noites antes do sono, estava quase terminando... Senti pena dele. Quando será novamente que terei a paz de ler em papel aonde a figura não está ao alcance de um clique? Nisso o Nietzsche ainda tá na frente dos 4 últimos que comprei. Meu Deus o que será do Garcia Márquez? Pobre Neruda sem hiperlynks... Será que ficarão todos na cabeceira observando impassíveis o piscar das janelas através da minha íris...? Ou será que serão recolhidos ao armário pra liberar espaço pros hardwares...?
Agora sinto um pouco de culpa e pena dos artesanatos que tava fazendo faz pouco tempo e que já quase escrevi que “fazia”... Quando será que terminarei aquelas florzinhas...? Pelo desenrolar dos acontecimentos, parece que só depois do último backup.
Como uma criança que ganhou um brinquedo complexo, quero entender como funciona e isso exigirá a remoção de algumas peças... - É claro que não farei isto, também por causa da garantia, etc. - Mas a sensação de curiosidade, deslumbramento e receio são idênticas.
Acabei de me dar conta que este talvez seja o último post em folha de papel que escrevo. Porque em breve a tecnologia dos RSSs chegarão pela rede, em fonte padrão, quase no automático.
Não sei, não sei mesmo. Estou com muito medo desse negócio de gerenciar tarefas, instalar aplicativos e administrar.
Mas já botei a máquina em stand by e já agendei as próximas atualizações pra mais tarde. E agora estou com muito sono...

Preciso reiniciar.


Snow, virtual.

quarta-feira, dezembro 17, 2008

Ai, ai...

Toda esperança é uma presunção. Uma superestimarão de si ou do todo.
A esperança nasce do desejo e desejar é achar possível o que pode não ser.
Esperar é acreditar, ter fé. Seja por se achar merecedor apesar de difícil o objetivo ou por achar que o objetivo é fácil.
Ter esperança é "realizar" o talvez sob as melhores circunstâncias. É ver o ideal, é apostar na possibilidade. É desafiar a lógica às vezes e enxergar um túnel onde se tem cruzamentos. É entender que "só pode ser!" quando, na maioria das vezes, nem poderia... E encontrar mais um motivo pra agradecer a Deus, ao anjo-da-guarda, ao amuleto da sorte, ao orixá.
Ter esperança é eleger uma situação como melhor, embora pouco provável. Visualizar o caminho até o ideal. Andar por ele às cegas, sem a certeza se se afasta ou aproxima do acaso do encontro.
Pra se ter esperança é preciso não desejar detalhes. Só uma imagem difusa – sem este afastamento, seria impossível aceitar o “presente” quando este enfim chegasse.
É preciso deixar as lacunas para que a própria esperança as preencha. Sem as quais, ela ficaria de mãos atadas.
O paradoxo é que quanto mais a esperança esteja desfocada, maior a sua probabilidade de dar certo, se superados dois dos possíveis obstáculos que podem vir acoplados:
O primeiro, é que a gente pode não reconhecer o bem. E nesse caso acharmos que não era bem isso o que esperávamos;
No segundo caso, o bem pode não nos reconhecer. E aí ficaremos frustrados.
Na verdade, pra se ter esperanças é preciso desejar o mínimo possível, a menor unidade esperançável: um estímulo, um estado, uma sensação... Qualquer coisa de pessoal e subjetivo que se possa realizar com o material. Dessa forma será sempre emocionante quando tivermos conosco o algo tão almejado.
E olharemos nos seus olhos – se ele olhos tiver – e nossa alma ofegante falará pelos poros, pulmões e lábios:
Eu já sabia! Isto é tudo pelo qual há muito tenho esperado! E era exatamente assim, cada detalhe...

É... Tá explicado.


Snow, verde, verde...

quinta-feira, dezembro 11, 2008

Olha que coisa mais linda!

Canção do floco de neve

Aquela que está inquieta
não se pode conter
com afagos,
Há um soluço preservado da festa,
há uma semente de flor
que brotou entre os cardos.
Aquela que foi escolhida
irá dançar essa noite com o rei.
Não a verei de arco-iris vestida
nem colherei sua lagrima
inibida
ela recebeu da dor uma lei.
Aquela que brilha, sem ofuscar
que ama com sutileza e ardor
irá embarcar para o bosque da vida
nas raizes do mundo acolhida
irá explodir em um carrosel multicor.

(Hiltom Leal)


Snow, mais cheia de graça.

terça-feira, dezembro 09, 2008

Adentrismo

Quando a gente passa a ter um cachorro não há mais como não alimentá-lo. Ou lhe damos comida sempre ou ele nos devora.
Desconfio que em nossa alma more também um cachorro que, independente do comportamento, da raça ou do grau de adestramento, sente fome. E avança se lhes tiramos o osso. E obedece se chamado pelo nome.
Se o cachorro da alma é tratado de forma irregular porém, ora com afagos, ora com hostilidade, temos aí um caso típico de desamparo aprendido. O cachorro aprende que qualquer que seja o seu comportamento, pode lhe sobrevir recompensa ou castigo.
Nesse caso, o nosso maior erro é não compreendermos isto. Porque, ao invés de como pensamos, a agressividade devesse ser paga com hostilidade e o contrário, reciprocamente com afagos, o cachorro de nossas almas tanto poderá abaixar as orelhas para um grito, quanto mostrar os dentes em resposta a um carinho.
Esse animal que, imagino, já deva vir com nossa alma, serve para que lembremos que o espírito não admite ser machucado pelo corpo em que habita.
Assim, o cãozinho dócil que protege a casa onde minha almazinha reside é espirituoso.

E embora eu nunca saiba se será com choro, gracejo ou rosnado, ele, se maltratado, revida.


SnowFlake

P.S.
Como o texto anterior ficou muito impessoal e eu não sou assim tão infinitiva, veio este adendo.

Aforismo

Por piores que possam parecer as conseqüências da vida social, elas não podem superar as do isolamento.
Quem tem animal doméstico certamente já pôde perceber o que acontece se ficam privados por algumas horas do contato com seus donos, pois eles tornam-se tanto mais dóceis e afáveis quanto maior for a ansiedade e a esperança de serem afagados e acalantados. Os de maior porte parecem ainda mais patéticos. Os menorzinhos, totalmente vulneráveis.
Já se a privação é maior e a distância é aumentada em tempo, eles se tornarão tão hostis e agressivos para qualquer tentativa de aproximação que, independente de ser compreendida a intenção do dono, poderá ser respondida com violência.
É por isso que, embora saibamos que as pessoas que vivem rodeadas de pessoas são também rodeadas de problemas, não se pode julgar seus comportamentos fúteis e seus laços efêmeros como piores do que os daqueles que não têm laço social algum porque não aprenderam a não dizer o que machuca ou não sabem suportar as frivolidades do outro.
Mais árduo ainda do que ser definitivamente deste ou daquele modo é quando os dois tipos casualmente se encontram.

O raso sente-se entediado frente ao profundo.
O profundo, diante do raso, sente nojo.


Snow, da série "Diálogos da solidão com a multidão".

sábado, dezembro 06, 2008

Confissão

Sempre que me sinto descoberta
Sinto-me também ré descoberta
Como se o flagra fosse também flagrante
E prova do meu crime de existir.

Tenho medo que me peguem evadida
Que me enquadrem, me aprisionem, me condenem.
E evito testemunhas oculares
Escondendo-me entre olhares evasivos
Restringindo todo o acesso a mim possível
Sob táticas e estratégia de segurança.
Dificulto toda forma de contato

(Excetuo a esta regra as crianças,
E aos que não se podem imputar qualquer contravenção)

Pros demais ando armada até os dentes
Limitando-os a não chegarem perto
Com restrições, percalços, contratempos.
Dificulto e dissimulo parecer inocente
A tudo quanto me interrogam eu lhes nego.
E todo o meu desejo é de escapar

Meu receio é que percebam que me entrego
Com a sutileza as vezes de um olhar...


SnowFlake

P.S. Foi como compor em outro idioma...
E sei que ainda vou editar diversas vezes.

Diversão e Arte

Alguma coisa no ato de comer me desmotiva.
Não sei se o sabor ou o meu despreparo ao preparar a comida, não sei.
Só sei que sinto uma fome ensandecida.
E vontade de comer zero.
Salvo algumas vezes em que como desesperadamente e chego até ficar otimista. Mas aí, logo canso. Do gosto, do cheiro... nada me dá mais prazer e sei que não pode ser sadio.
Morro de inveja dos devoradores de pratos. Desses que não deixam passar nada, matam e morrem por comida e depois ainda ficam com água na boca, um gostinho de "quero mais"... e repetem!
Sei que Freud explicaria num piscar de olhos. Mas prefiro Pavlov com seu cãozinho que salivava só de pensar...
Odeio ser tão magrinha, odeio! Embora os outros gostem... Não posso negar que quanto a isto ao menos sou mais feliz que as que odeiam ser tão gordinhas já que, depois de adulta, ouvi raríssimas criticas à minha forma esguia.
Ontem mesmo um cidadão me chamou de “mulheródromo”! Não olhei pra cara do cabra, acho até que inventou na hora esta palavra. Mas depois de alguns passos soletrando vi que esse era candidato a um dos maiores elogios que já recebi em matéria de polissílabo! Rs
Pensei depois que o fato de ouvir mais elogios que criticas de certa forma me incentivam pois não me acham tão mal por ser tão magra. Reforço. Pra mim, uma desgraça.
Só por isso sei que não sou anorexica. Mas por outro lado esse “só por isso” em nada me agrada.
Desde a infância tive o sonho de não ser tão magrela. Com o estirão da adolescência, então... vieram mais infinitos motivos: “magricela”, “vara-pau”, “seriema”, “papa-vento”... Lembro nitidamente que o menino que me colocou este último uns dias depois me pediu pra namorar. Era um moreno cor de canela com dois olhões verdes hipnotizastes que até hoje ainda consta da lista dos + + + do bairro... Mas eu não consegui perdoar.
Ao longo do tempo anotei algumas “simpatias populares” pra mudar esse meu quadro:
• Comer 3 bananas por dia.
• Comer farinha, muita farinha, encher o parto de farinha.
• Comer aipim, batata-doce, fruta-pão e inhame.
• Comer feijão antes de dormir.
• Comer doces e frituras.
• Comer coisas com alto teor calórico.
• Tomar muito refrigerante depois de comer.
• Comer salgado, depois comer doce.
• Comer rápido.
• Comer seis vezes pro dia.
É incrível como essas magias são mesmo bastante eficazes, mas... quem vai colocar o guizo no pescoço da gatinha?
Não tem aí nada que engorde que não seja preciso comer, não?
Ah, tem sim!
• Anticoncepcional.
• Deca, Megamass, Sustagem, Cobavital.
• Postafen e Buclina com Rarical.
Tomei doses cavalares. Overdosei e nada.
Falta tentar silicone... Mas não estou bem certa se terei cabeça pra ter corpo da noite pro dia. Prefiro pensar que será gradual, quase como se Deus assim tivesse feito. Ai, ai...
Aliás, tem um jeito! Há uma coisa que faz engordar sem comer. – Mas nesse caso teria que ser sem contraceptivos. – E eu não gosto de dar razão a Freud, sou behaviorista.
No Piauí tive a oportunidade de comer tatu. Legal mesmo tatu. Difícil é criar... e aí tem sempre um piauiense pra explicar que tem que fazer uma piscina, cimentar bem o chão, encher de terra e só depois colocar o tatu. Também lembram que é proibido caçar tatu. E criar, só com autorização do IBAMA. Mas se eles souberem que é pra comer, não autorizam.
Pensar em comer me tira a fome. Mesmo uma coisa gostosa como tatu, sabe? E eu vi os gominhos dele...
Até os vegetais! E mesmo os produtos industrializados como biscoito... ainda que de chocolate, aquela coisa boa que muita gente adora... Fico pensando no suor dos homens derramado... – e isso tem vários sentidos.
Já me vi muitas vezes pensando sob o ponto de vista do alimento. Ninguém merece virar, ah você sabe! Nem vegetais, nem carne, nem peixe e nem galinha.
Preciso de um divã!
Falando nisto, meu terapeuta anda muito ocupado com a tese dele de mestrado.

E eu se tivesse uns quilinhos a mais – não demais, um pouco mais – certamente já estaria mais bem resolvida.


Snow, slim. Pensando bem, quase de plasma.
Agosto de 2008.

sexta-feira, dezembro 05, 2008

Pessoa

Como é por dentro outra pessoa

Quem é que o saberá sonhar?

A alma de outrem é outro universo

Com que não há comunicação possível,

Nem há verdadeiro entendimento.



Nada sabemos da alma,

Senão da nossa.

As almas dos outros são olhares,

São gestos, são palavras,

Supondo-se qualquer semelhança no fundo.


Entendemo-nos porque nos ignoramos.

A vida que se vive é um desentendimento fluido,

Uma média alegre entre a grandeza que não há

E a felicidade que não pode haver.


(Poesia de Fernando Pessoa, recitado ontem por Antonio Abujamra, Provocações.)



Snow, que apenas "colocou" o título e ouviu o poema...

É Primavera...

Aniversário do Blog.
Queria ter um blog todo colorido. Com fotos, gliter, pássaros voando no cursor, estrelas cadentes talvez... – Uma coisa ou outra pra não estragar. – Mas não sem nada, seco.
Fotos. Acho legal essa galera que arruma a casa. Filmes, música, ilustrações... Só que não deu certo. Tenho que confessar que não foi por falta de tentativas, e sim porque em matéria dessas coisas todas eu sou uma desgraça!
Também porque isso leva tempo e parece que é preciso uma máquina pra armazenar o arquivo original, não sei. Tem coisa que é difícil pra caramba fazer quando a única base é a lan house. Então foi ficando sempre pra depois.
O relógio ta quebrado. Deu um trabalho danado pra botar e já chamei o técnico umas mil vezes e nada. Continua na hora errada.
O contador, que era o que eu mais queria, não veio porque parece que é mais difícil.
Faz muito tempo que não mudo nada aqui porque tem coisas demais e eu não tenho nada disso em outro canto. Medo de mexer e quebrar, perder. A vulnerabilidade dos bytes on line é um dos fantasma que mais me assusta. Aliás, o nome...
Tento me acalantar por saber que nada é imortal, por mais que o ser humano custe a se conformar. Nada poderá ser preservado por toda a eternidade. A própria vida é provisória.
Dia desses vi um cachorro ser atropelado.
O cara freou, tentou parar, fechei os olhos, mas não pude deixar de ouvir o baque.
E os uivos desesperados do pobre que alguns segundos depois apareceu sangrando... Agora só podia contar com três das quatro patas.
Eu que o tinha visto alegre, brincando, pouco antes... é foda!
Nada me controla mais que a responsabilidade de preservar minhas faculdades. Sei que há um abismo indescritível entre o ter o não ter mais, ou o não ter tido. E há infinitas possibilidades de dar errado...
Por isso que não faria cirurgia de miopia, astigmatismo, essas coisas.
Por isso que não troquei ainda este layout.
Já ta na hora, é verdade, faz 4 anos. Mas as coisas já estiveram tão piores antes... Sinto até que deveria comemorar.
Mas a inspiração não veio.
Melhor, até que veio. Porém não bonitinha, enfeitadinha, engraçada.
A inspiração veio faminta, veio suja, rasgada. Adoecida de tanto frio e repulsa. De tanta falta que, suspeitei que seria melhor não mexer em nada.
Lamento mesmo que por aqui não tenha nada legal além dessas palavras desgrenhadas. Mais um ano se passou e eu não coloquei a porra dos passarinhos ou da estrela ali, pelos lados...
Mas é bom.

Menos um pra ficar assustado.


Snow, bodas de plástico.

P.S. O correto é bodas de flores e frutas, mas não cabe.
P.S.1. Era pra ter sido postado há 3 meses. O ruim de reciclar é que vc fica com uma cara que já não tem mais, mas que era mesmo a cara do texto.
P.S.2. Essa distância entre a pessoa e as palavras antigas tem seu ar de sadia.
Saber que embora fiel a foto, o rosto já não é mais daquele jeito...
Tal qual o cheiro das coisas que só a gente lembra.
Ou as bactérias da alma digerindo o beijo...

quinta-feira, dezembro 04, 2008

Idade Antiga, Idade Média, Idade Moderna...

Há coisas que não devem ser ditas antes de poderem ser ouvidas.
Essa frase parece óbvia, mas acreditem, é preciso algum tempo pra que possa ser compreendida em toda a sua profundidade. E esse tempo está bem longe da infância e da adolescência. Talvez até da idade madura. Sim, porque é preciso mais sabedoria pra calar que pra dizer.
Antes desse estado temos aí a “manha”, a “malícia”, a “experiência” que são precursores brutos da chamada “sabedoria”.
Há quase um mês uma vizinha me encontrou num ônibus e veio sentar do meu lado pra conversar comigo. Saber das minhas viagens, provas, concursos, de como vão meus estudos... O brilho em seu olhar quase me envaideceu mais do que me permito, porém tive que lembrá-la de que nada daqueles elogios muitos que me fez poderia ainda ser dito. Porque é ainda meio do caminho. Talvez pré-história, início.
É pelo menos assim que a Historia nos é contada. Existe sempre um modelo do que é “dar certo”, ser “bem-sucedido”, obter “êxito”, e dentro destes padrões e seus opostos é que se traçam os personagens e seus atributos. Quando eles conseguem é “revolução”, “conquista”. Se perdem é “revolta”, “motim”, “rebelião”, “tetativa”. E é preciso esperar. Até porque, as vezes, no meio, é impossível predizer o que virá depois de um tempo. Principalmente quando já vimos muitos começos se perderem...
Dos 17 aos 22 eu estive fascinada pelos começos. Adorava começos. Todos: um novo curso, uma nova turma, um novo encontro, um novo dia, uma nova possibilidade... todos eram flores!
Dos 23 aos 29 no entanto, me converti calorosamente aos meios. E danassem-se os fins! Ou o que tivesse ocorrido ocasionalmente para que fosse assim. Importava o que era, o que tinha, o que vinha sendo. Dar certo era sinônimo de ter tido um meio. Ter passado do começo por um caminho...
Também, começar havia ficado bem mais arriscado. Começar de novo então, meu Deus! Tudo menos o desconhecido! Já os velhos erros eram bem-vindos...
Alguma coisa parece ter mudado discretamente porque já não me sinto próxima do primeiro nem do segundo nível.
Sinto-me mais inclinada ao fim.
Um dia termina, sabe? Acaba.
E aí a gente vê se deu ou não certo. Mas antes desse ponto tudo é metade. É rabisco, é projeto... rastro.
E há coisas que ainda devem se manter impronunciadas.
É preciso passar o portão pra rir do cachorro, ter uma câmera pra falar das próprias fotos, pedir demissão pra mandar o chefe tomar no cu, sair de casa pra testar a potência das caixas-de-som, pagar a conta pra apagar as luzes...
Adolescentes pensarão ter mil e um argumentos pra cada uma destas frases/ períodos. Mas não usarão nenhum corretamente. Baterão portas, arremessarão pratos, dirão alguma palavra feia, um grito, uma evasiva.
Crianças não compreenderão. E nem todos os adultos. Porque idade não basta.
Eu já fiz coisas geniais com quase nenhuma prática. Mas já não quero mais fazer pedidos nem esfregar lâmpadas...
Nos próximos tempos, do esforço brotará o talento limado a ferro e fogo.
E depois do começo será meio até o fim.
Porque meu espírito de gênio já foi genioso demais comigo.


Snow, Idade Contemporânea.

P.S.
Este é novinho, tem uns 15 dias. Nasceu logo depois da certeza de que o anterior estava pronto, era parte do P.S. Mas aí ficou grande demais...
As metáforas vão ficando mais evasivas mesmo. É esse tal pós-modernismo.

P.S.1.
Um dia eu vou atrasar os textos só porque deu preguiça...
Ai, ai...

quarta-feira, dezembro 03, 2008

A minha Rolley-flex...

Queria ter fotos.
É. Essa coisa simples que a gente simplesmente deleta agora na era dos cartões de memória e que gosto tanto...
São provas, sabe? São quase fatos. São lembranças, são o momento congelado, a recordação...
Lembro-me que quando criança me olhava muito no espelho e principalmente quando chorava. Precisava ter um espelho pra abrir os olhos vez em quando e ver como ele me dizia que era, e não como me sentia de olhos fechados, já que a imagem que tinha de mim no escuro não podia ser fotografada - porque ninguém acreditaria ser minha... Então tentava o contrário. Usava o espelho pra acreditar que existia alguém diferente do que eu imaginava.
Ainda me olho muito no espelho. Alem da vaidade feminina, pra não perder o referencial. Senão o rosto que tenho é gradualmente sobreposto pelo resto do que sinto. Que penso que sinto.
Li uma vez numa página avulsa de um livro que um amigo lia que havia num certo lugar certos monges cuja ordem não permitia que vissem um espelho. Estes monges permaneciam por toda a vida sem nunca conhecer o que os outros sabiam dos seus próprios rostos. O objetivo da doutrina era que nunca precisassem confrontar seu eu imaginado (alma) com o eu físico (corpo).
É claro que parece uma grande utopia e não funcionaria comigo, mesmo que eu fosse uma monja enfim, porque tenho sempre um espelho comigo. Eu que me aproximo de tudo o que me reflete quase que como vicio. Dessa forma janela de carro, vidro, monitor desligado, maçaneta de porta, tampa de panela, verso de CD/DVD ou qualquer outra superfície polida me atraem como água. Poça d’água, no caso. Mas o modo de vida dos monges do livro, achei bonito.
Só não trocaria pro ter fotos.
Em especial dos lugares que queria ter ido, dos sorrisos que queria ter tido, das sensações que queria ter vivido...
Tenho cicatrizes, marcas, sulcos que margeiam o caminho percorrido por lágrimas. Isto não prova nada, sequer registra.
Deve ter havido coisas boas, é verdade. Coisas que só eu vi de olhos fechados. Mas que não eram o que o espelho me dizia.
Lembro de resmungos, reclamações, descontentamentos, vontade de não estar ali, ou de que não fosse eu quem estivesse... Lembro de ter ouvido gritos.
Lembro de frustrações inquestionáveis, de mal-estar, choro, estupidez... mal humor, grosserias, cenas tão nítidas...
Ele até que se esforçou pra fazer bem feito. Lembro do esforço - pra isto sempre há de haver em mim espelhos. Já as fotos, que contrastariam com as imagens que só eu tenho dele... elas não existem.

Nem ele.


Snow, janeiro de 2006.

P.S.
Esse texto tem quase três anos. Reli muitas vezes desde que foi pro papel e muitas vezes antes também. Em todas as releituras foi reprovado.
Dava um intenso mal-estar saber que ainda existia inédito por ser impublicável. Carregando cada vez mais o fardo insustentável do fracasso.
Nesse espaço de tempo em que vi todos os amigos, conhecidos e afins comprar câmeras, filmadoras, celulares e toda sorte de tecnologia retratável - foi-se o tempo da Polaroyd - , me sentia cada vez mais distante. Tanto que sequer tive coragem de pedir emprestada deles pra "dar uma volta".
O peso sobre as pálpebras vinha da certeza de que não podia dar prioridade a isso em detrimento de... nada! Porque não conseguiria construir nenhum argumento justificável.
Toda dor vem do que não se justifica, sabe? É. Dói o que não tem porquê, ou não parece ter.
O que não pode ser entendido, aceito, elaborado. A partir do momento em que há símbolos que respaldem, a dor já não alcança mais a alma.
E o texto também doía...
Há alguns dias me inquietava por já poder vir ao mundo consciente e por um motivo bem pequeno e simples: 8.3 mega pixels, eu agora tenho uma câmera.
Sei que ainda vai demorar um tempão pra conseguir ter fotos que façam algum sentido, que expressem algo além do meu vislumbre pela imagem que quase sempre não é a que meu espelho interior me mostra e, talvez demore muito mais pra eu visitar os cenários e estar com ilustres companhias fotografáveis, mas agora o problema deixou de ser bytes, entende?
Não? Ok.
Depois teremos fotos melhores.

P.S. 1.
Tirei recentemente uma foto só pra saber que existiu...
Mas é dessas que não se pode revelar.


SnowFlake